Todos nós já passamos por isso. Em algum momento, chegamos naquele ponto em que pensamos em desistir ou, para usar um termo do mundo do Jiu-Jitsu, “bater”.
Mas às vezes não notamos que, nesse exato momento, também estamos diante de uma oportunidade de evolução e desenvolvimento. Nos dias de hoje, tendemos a enxergar o ato de “bater” sempre como um fracasso ou derrota. No entanto, isso também pode significar que chegamos a um ponto em que não estamos conseguindo avançar. Essencialmente, é quando atingimos nosso limite. Mas é justamente aí que grandes mudanças podem ocorrer.
Olhando o “copo meio cheio”, a dificuldade de avançar não significa, automaticamente, que chegamos a um beco sem saída ou a um ponto de ruptura. Em vez disso, pode ser a chance de descobrir novos caminhos. Uma outra rota para chegarmos ao nosso destino. Em seu livro Hábitos Atômicos, o autor James Clear afirma que falhas são meros “pontos de dados”. Ele explica que, diante de cada fracasso, podemos aproveitar o momento como uma informação importante e um trampolim para o aprimoramento. É uma chance de revisarmos nossos planos. No mundo das artes marciais, é comum ouvirmos a frase “ou você ganha ou você aprende”, e a ideia desse ditado (em linha com o que James Clear expõe) é que todos temos o poder da escolha quando estamos em nossos pontos mais baixos, podendo desistir ou nos levantar e seguir em frente. O palestrante motivacional Les Brown disse certa vez: “Se for para cair, caia de costas. Se você consegue olhar para cima, também consegue se levantar.”
Atuando como psicólogo no tratamento de pessoas com problemas de saúde mental e dependência química, e competindo ativamente no Jiu-Jitsu esportivo, tanto em nível local como mundial, eu já ouvi e vivenciei muitas histórias e desafios sobre enfrentar os fracassos, o nosso “fundo do poço”, e consegui identificar o que separa aqueles que saem desse ponto mais baixo e seguem adiante daqueles que ficam presos no mesmo lugar: a maneira de pensar. Seja em uma luta contra a ansiedade ou a depressão, uma batalha para se manter sóbrio ou a rotina para buscar o primeiro lugar no pódio de um torneio, a forma como uma pessoa reflete sobre seus fracassos e derrotas é um indicador importante de como ela se sairá desse processo – uma versão melhor de si ou não. Em outras palavras, trata-se de buscar o lado positivo das coisas diante de qualquer situação. É saber tirar o conhecimento presente nas derrotas. Posso dizer com sinceridade que algumas das minhas lições de vida mais importantes, dentro e fora dos tatames, surgiram após uma derrota ou falha.
Além disso, para avançarmos rumo à nossa melhor versão em qualquer área da vida, precisamos “dominar nosso ponto de ruptura”, conforme explica o evangelista e escritor TD Jakes quando busca inspirar aqueles que passam por dificuldades. Devemos lutar até superar essa mentalidade autodestrutiva que tenta nos convencer de que já alcançamos o nosso máximo. Aquela voz que nos diz para desistir. Diante de uma dor ou desconforto, muitos de nós podemos concluir erradamente que estamos diante do ponto final. Na verdade, é nesses momentos que precisamos explorar nossas reservas de energia para superar os limites. Certa vez, um repórter perguntou ao Bruce Lee quantas flexões ele conseguia fazer. Sua resposta foi: “Eu não conto enquanto não começa a doer”. Outro ditado que aprendi sobre esse impulso que nos leva além estava em um quadro no escritório de um colega de trabalho: “A vida começa onde nossa zona de conforto termina”.
Por fim, tente se lembrar de alguma oportunidade em que você fazia uma série de supino ou realizava um exercício mais desafiador e contou com o incentivo de alguém para seguir adiante, quando achava que já não conseguia avançar. Nesses casos, aquelas últimas repetições que fazemos parecem valer ainda mais e fazem grande diferença. Fisicamente, são elas que rompem nossas fibras musculares e abrem caminho para o crescimento. Mentalmente, elas nos ajudam a provar que ainda tínhamos mais em nossa reserva de energia psicológica.
Esta lição de seguirmos em frente e não para longe daquilo que nos traz desconforto vale para as mais diversas situações da vida, e fica ainda mais evidente nas áreas em que triunfamos. Vamos imaginar, por exemplo, um bem-sucedido estudante de matemática. Normalmente, ele buscará ir além, resolver problemas cada vez mais complexos, ficar acordado até um pouco mais tarde ou ler livros extras para seguir se destacando. São atividades que empurram os limites dessa pessoa para além da sua zona de conforto. Meus pacientes que desejam superar quadros de ansiedade social precisam enfrentar a situação e não fugir dela. Isso significa se colocar continuamente em ambientes sociais ao invés evitá-los, aumentando seu nível de conforto com o passar do tempo.
Para um aluno de Jiu-Jitsu alcançar um novo patamar em seu jogo, ele também precisa estar disposto a se colocar em posições mais complicadas e desconfortáveis, desenvolvendo suas habilidades até que não sejam mais seus pontos fracos. Por exemplo, se ser montado é o seu maior medo em uma luta e onde você é finalizado com mais facilidade, este deve ser o seu foco nos treinos e sessões de sparring. Sabemos que é inviável lutar para jamais ser montado. Cedo ou tarde, você se encontrará nessa posição, muitas vezes em um treinamento específico e de forma inesperada, talvez por uma faixa-laranja de 15 anos super ágil e flexível. A cada vez que você estiver naquela situação, será estimulado a evoluir e, eventualmente, aprenderá a escapar com mais facilidade. No entanto, esse ponto só chegará se você buscar se colocar nessa zona de desconforto.
Eu vejo isso acontecer com muita frequência: pessoas evitando suas fraquezas, medos ou desconfortos. No entanto, evitar certas situações acaba fazendo com que elas surjam nos piores momentos. E aí, você não terá se preparado o suficiente para sair delas. Este modelo de enfrentar nossos medos e desconfortos, também chamado de Terapia por exposição ao vivo, pode ser aplicado em quase tudo, como para lidar com o medo de cães, de altura, de avião, das competições, etc.
Eu também preciso ouvir meus conselhos e lembrar de superar meus próprios pontos de ruptura. Participar das aulas de competição todo fim de semana na sede da GB me ajuda a lembrar dos meus limites. Após uma hora e meia de treinamento e sparring intensos (90 minutos tem sido meu ponto final atualmente), meus músculos começam a se contrair, minha asma piora e já me sinto mentalmente esgotado. Então, pego meu massageador muscular e me sento, assistindo aos meus colegas lutarem pelos últimos trinta minutos da aula e se esforçando para alcançarem seus pontos mais altos. Muitas vezes me pergunto se estou realmente maximizando o meu potencial. Normalmente, tirar o kimono, a faixa e os equipamentos de segurança colocam você em uma “zona segura”, deixando de ser um candidato para o sparring. Mas não para o Professor Philipe Della Monica. Com frequência, ouço o chamado dele: “Eddie Bravo, vamos!” (apelido que ganhei do Professor Philipe por achar minha fisionomia muito parecida à do lendário lutador e professor de Jiu-Jitsu).
Como uma criança que acordou do seu cochilo na sala de aula, me levanto rapidamente, coloco meu kimono já encharcado, meu capacete, dou uma última baforada no inalador e cumprimento meu parceiro ao lado. Todas, tentativas fracassadas de enrolar. O Professor espera pacientemente e sorri até que eu termine esse ritual antes de acertar o timer para oito minutos. O que ele está fazendo é me empurrar para além do meu “ponto final padrão”, aquele momento em que minha mente me dizia que já era o bastante. Modéstia à parte, sinto que o Professor acredita no meu potencial e sabe que ainda há mais no meu tanque de energia inexplorado de Jiu-Jitsu. Como competidor, preciso me esforçar rumo a níveis ainda maiores, pois meus oponentes provavelmente estão treinando mais do que eu e maximizando seus pontos de ruptura. Não à toa, esse tipo de empurrão constante explica por que o Professor Philipe tem em seu currículo de treinador nomes dos mais diversos campeões mundiais de Jiu-Jitsu e MMA. E, acreditem ou não, essa postura também me levou humildemente, por várias vezes, até o cobiçado ponto mais alto do pódio.
Então, da próxima vez que estiver pensando em desistir ou “bater” no tatame ou na vida, ao invés de se martirizar por um suposto fracasso, encare o momento como a chance de se aprofundar e uma porta de entrada para o aprimoramento. Uma estratégia para alcançar o que há de melhor em você.
Todos somos arquitetos de nossas vidas. Precisamos ser especialistas em nós mesmos, ou capitães de nossos navios. Uma maneira de manter o progresso e dominar seu ponto de ruptura é aprender a se sentir confortável diante dos desconfortos. É seguir em frente. Enfrentar essas situações, ao invés de evitá-las. Em pouco tempo, você terá superado seu antigo ponto de desistência e estará em um outro nível em seu Jiu-Jitsu e na vida.
Blog escrito originalmente em inglês por Brian F. Licuanan, faixa-roxa da Gracie Barra
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